Andamos no protótipo que testa os limites dos próximos BMW e antecipa M3 elétrico
O BMW Vision Driving Experience testa, na prática, os benefícios do novo supercomputador que gerenciará, sozinho, as principais funções dos BMW Neue Klasse

Um carro moderno pode ter algumas dezenas de módulos de controle diferentes, que conversam entre si por meio de redes com transferência de dados cada vez mais rápida. Mas essa velocidade não é suficiente para a BMW, que vai integrar os principais módulos em um único supercomputador que será usado na sua próxima geração de carros elétricos, a Neue Klasse, cujo primeiro modelo está previsto para o fim deste ano.
Esse supercomputador tem um nome singelo: Heart of Joy, cuja tradução seria “coração do prazer”. Um pequeno módulo do tamanho de um aparelho de TV a cabo, desenvolvido pela própria BMW, é responsável por integrar todo o gerenciamento dos sistemas de motor, freios, direção, regeneração de energia e carregamento.

Quer dizer que tudo que diz respeito ao funcionamento dos motores e ao controle dinâmico dos carros estará centralizado no mesmo módulo. É como se a ECU de um motor a combustão estivesse integrada com os controles de estabilidade e tração.

A primeira vantagem está em eliminar o atraso na comunicação que existe quando diversos módulos (eventualmente feitos por diferentes fornecedores) precisam se comunicar antes de tomar uma decisão. A BMW garante que isso melhora o tempo de reação em mais de 10 vezes: se o atraso era de 10 milissegundos, agora será de menos de 1 milissegundo.
Quais são os benefícios?
Antes que o assunto alcance níveis de nerdice extremamente enfadonhos, é melhor tratar das vantagens que o Heart of Joy promete. Para o motorista, representa um tempo de reação entre a pressão no acelerador e a resposta do motor (ou dos motores) muito mais rápida, além de uma maior precisão dos controles de estabilidade e até um aumento significativo no conforto e na autonomia dos carros elétricos. Isto sim merece uma explicação mais profunda.

O melhor gerenciamento aumenta a precisão do controle de tração, permitindo que os motores atuem no seu verdadeiro limite em cada situação, mantendo a trajetória ao mesmo tempo que a condução fica mais fluida sem tanta interferência nos freios ou na velocidade.
O ganho na autonomia vem da otimização da energia e também de uma maior capacidade de regeneração da energia cinética. A BMW assegura que 98% dos motoristas não precisarão recorrer aos freios convencionais, pois a potência gerada pela recuperação de energia é suficiente para a condução do dia a dia. Apenas em frenagens mais intensas – como em emergências – é necessário o acionamento dos freios a disco tradicionais.

Outra vantagem seria a melhor gestão da regeneração para que seu efeito seja o mais parecido possível com um freio convencional ou até mais suave, aumentando o conforto e evitando os enjoos que freios regenerativos muito fortes costumam causar. Esse novo módulo gerencia, até mesmo, qual roda aplicará a regeneração em função do percurso, com o intuito de deixar o carro sempre o mais estável possível.
A regeneração ficaria encarregada até mesmo de segurar o carro em manobras ou durante o uso do piloto automático adaptativo e estaria integrado ao freio de estacionamento. Desta forma a eficiência energética pode ser melhorada em até 25%.
Teste prático

Há muitas vantagens e a mais importante delas, pelo menos sob o ponto de vista da BMW, será a escalabilidade. O mesmo módulo Heart of Joy seria capaz de lidar com carros elétricos de um motor ou até de quatro motores (hoje, os BMW elétricos têm no máximo dois), e ainda gerir o funcionamento das funções de diferencial com deslizamento limitado e de eixo traseiro esterçante.
Para atestar todo o potencial deste supercomputador, a BMW construiu um único protótipo de um super sedã elétrico todo em fibra de carbono que integra aquilo que considera o próximo limite técnico dos seus carros. Este carro, inclusive, adianta o design dos carros da família Neue Klasse.

Chamado de BMW Vision Driving Experience, este carro não tem todos os seus detalhes técnicos conhecidos. Fala-se em quatro motores elétricos e “muito mais de 1.000 cv” – que poderia ser um total acima dos 1.300 cv. O que a fabricante diz abertamente é que 1.835 kgfm (sim, é um torque absurdo) chegam às rodas.
Este protótipo ainda tem superventiladores na frente e atrás para fazer efeito solo. 1.200 kg de downforce são gerados para que o carro agarre no asfalto e não destracione tanto. Esse ar sai pelo meio do capô e pelo meio daquela que seria a tampa do porta-malas – onde, na verdade, estão apenas os módulos de carregamento das baterias, cuja capacidade também é desconhecida.

O desenvolvimento de um carro tende a ser estressante, mas também pode ser divertido. Que o diga o alemão Jens Klingmann, que está na BMW Motorsport desde 2013 atuando como piloto de desenvolvimento (tem os M4 GT3, M4 GT4 e o M2 CS no currículo) e também como piloto de provas de endurance, como as 24h de Nürburgring, Dubai e Spa Francorchamps. Desta vez, sua responsabilidade seria mostrar aos jornalistas um pouco do que este protótipo extremo é capaz de fazer.

Eu, particularmente, já havia ficado assombrado vendo as outras voltas. Era legal ver luzes montadas nas calotas para mostrar a distância as acelerações (luz verde), a regeneração (luz azul) e o uso dos freios (luz vermelha). Mas o que chamava mesmo a atenção era que o protótipo consegue queimar os quatro pneus ao mesmo tempo na largada. O carro foi entregue ao Jens para fazer graça. E ele fez.

As voltas no BMW Performance Center, em Greer, na Carolina do Sul (EUA) eram fritando os pneus. Sentado no banco traseiro (esportivo e individual, com uma barra à minha frente para que eu me segurasse como em uma montanha russa) eu sentia os pneus escorregando pelo asfalto em praticamente todos os momentos que o carro estava acelerando, fosse em curvas ou nas retas.

Ele também brincou de fazer zerinhos com o carro e depois ainda ativou o efeito solo e demonstrou como isso interfere na precisão do carro. De dentro do carro, você sente ele se grudando ao chão. De fora, observa a fumaça dos pneus saindo pelos dutos dos ventiladores. É um absurdo. A BMW diz que durante os testes (os sérios, para a validação do Heart of Joy) eles conseguiram alcançar uma força de aceleração lateral de 3 g.

Para Jens, porém, aquela aceleração absurda que estávamos vendo e sentindo representava apenas 40% do potencial do protótipo. Bom é que o BMW Vision Driving Experience também mostrou, na prática, como é o BMW Panoramic iDrive, o head-up display gigante que substituirá o quadro de instrumentos, na prática. Da minha posição foi possível ver todas as informações que eram exibidas para o piloto alemão.

Não se empolgue muito. A BMW já se adiantou em dizer que este é um protótipo de validação para o supercomputador e não representa um carro que será lançado. Contudo, o novo BMW M3 elétrico já teve imagens divulgadas com ele ainda camuflado e o seu design não é muito diferente. Não terá a mesma potência, mas o Heart of Joy dele será exatamente o mesmo, trabalhando para que as sensações não sejam muito diferentes das de um carro a combustão.