Carros bem adaptados às condições do Brasil são apelidados de “tanques de guerra”. Mas reforços estruturais e até uma boa blindagem não seriam suficientes para trafegar em qualquer lugar do mundo sob a vigilância inimiga. É necessário estar preparado para absolutamente tudo o que pode dar errado. É isso que faz do blindado norte-americano Oshkosh L-ATV uma aquisição tão importante para o Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil.
Tivemos a oportunidade de conhecer e dirigir um dos primeiros quatro novos blindados leves que desembarcaram no Brasil. Até o final da década, serão 60. Os militares dos Estados Unidos, porém, já receberam 19.000 unidades desde 2016 como parte do programa JLTV (sigla para “Veículo Tático Leve”), criado para encontrar o substituto para o AM General HMMWV, também conhecido como Humvee, que serve aos militares dos EUA há 40 anos.
A fama em combates e em filmes de guerra, que até levou à criação do Hummer (sua versão civil), nunca ajudou a superar as tantas limitações da blindagem, do desempenho e do consumo. Especialmente porque sua blindagem às bombas artesanais no Iraque e no Afeganistão são adaptadas. O 0 a 100 km/h pulou para 37 segundos e o carro passou a quebrar ainda mais.
O Oshkosh L-ATV não é exatamente leve (na configuração destinada ao Brasil tem cerca de 7 toneladas), mas já nasceu preparado para o pior. Muito de seu peso é devido à blindagem, que suporta minas e bombas, também beneficiada pelo formato em “V” do fundo do carro para desviar o deslocamento de ar da explosão. Os assentos, com cintos de cinco pontos, são preparados para explosões. A estrutura do carro em si suporta 100% do próprio peso sobre o teto.
Como um Humvee, o L-ATV pode ser içado e transportado por helicópteros e aviões. Para isso, depende da suspensão com variação de 51 cm: quando na posição mais baixa, tem a mesma altura do veículo veterano.
A suspensão, por sinal, é uma das atrações do carro. Chamada de TAK-4i, é independente do tipo duplo A nas quatro rodas e tem um sistema hidropneumático gerenciado eletronicamente, que garante o nivelamento nas situações mais complicadas. Desta forma, pode escalar rampas de até 60%, andar de lado a uma inclinação de até 40%, superar alagamentos e lamaçais com até 1,50 m sem snorkel e, claro, encarar os caminhos rochosos mais difíceis.
A tração 4×4 é parceira fundamental na missão. Com blocantes nos dois eixos e também no transeixo, a tração é aplicada na diagonal: quando 4×2, a força chega às rodas dianteira esquerda e traseira direita, podendo funcionar em 3×4 e 4×4. Também é uma forma de se movimentar caso alguma roda seja danificada – explicando a existência de quatro sistemas de freio independentes, a ar. O estepe é tão grande que vai montado na traseira, próximo da eletrônica do veículo, e tem seu sistema de içamento.
Quem fica com o esforço é o V8 6.6 turbo diesel da família Duramax. Seria igual ao de uma Chevrolet Silverado 2500 HD se não fosse profundamente modificado pela empresa Banks Power para ficar mais robusto. Mudam componentes internos, revestem outros que podem sofrer corrosão e ainda permitem que o motor funcione também com querosene de aviação ou álcool. Gera pelo menos 400 cv e 120 kgfm – os números exatos variam e não são divulgados.
Por sinal, o motor não está em um compartimento blindado (o capô é de fibra de vidro), pois o objetivo deste veículo não é ataque, mas reconhecimento do território inimigo. Se for atingido, sensores apontarão o local do dano e cabe ao motorista ativar a função que ignora proteções do motor até chegar a um local seguro. Outro modo é o que eleva a rotação do ponto morto ao ligar, para deixar todos os sistemas operantes mais rápido.
Ainda tem o câmbio automático de seis marchas da Allison, geralmente utilizado em ônibus e caminhões, também em uma configuração mais robusta. Na verdade, ao volante esse blindado é praticamente um caminhão. Exceto, claro, pela visão tão restrita pelas pequenas escotilhas com vidros grossos. Tanto que é padrão na Marinha que um militar desça para guiar o motorista em manobras em locais mais apertados.
Apesar do peso e das dimensões, esse Oshkosh tem boa desenvoltura. Ele não esconde o peso, mas a direção é leve e a suspensão é tão competente que filtrou caixas de ovos e toras na pista sem se desestabilizar ou transferir essa movimentação para os ocupantes. Também não sofre com lama.
Mas o que realmente surpreende são as funções e equipamentos incomuns. Sendo um veículo tático, passar despercebido pelo inimigo é fundamental. Um botão à esquerda do volante é o blackout: desliga todas as luzes do veículo, enquanto um conjunto com seis baterias extras (além das duas usadas para o sistema de 24 V, como o de um caminhão) garante o funcionamento de todos os sistemas vitais por horas a fio com o motor desligado.
Entre eles está o poderoso sistema de ar-condicionado, que ajuda a gerar pressão positiva dentro da cabine hermeticamente fechada, evitando ataques químicos. Em caso de incêndio, detectores ópticos acionam extintores dentro do veículo.
A tripulação é fundamental para a operação, comandando funções da tração, da suspensão e de comunicação externa em monitores (que não podemos mostrar ligados) ou na torre de artilharia, que ainda não foi montada. A comunicação interna é feita por um sistema de intercomunicadores: a blindagem impede munição pesadíssima, mas não impede o barulho do motor V8.
O Oshkosh L-ATV pode ir a qualquer lugar, escalar rochas e quase submergir, até em zonas de conflito. No Brasil, será mais usado em missões de monitoramento e patrulha, operações de pacificação e exercícios, tendo a seu favor a mobilidade. Leva a tropa a locais onde blindados maiores, com rodas ou lagarta, enfrentariam problemas. E com mais segurança do que em blindados convencionais.
Veredicto Quatro Rodas
Novo blindado da Marinha garante proteção de tanque com muito mais desenvoltura em cenários urbanos. Mas é uma máquina que custa, pelo menos, 500.000 dólares.
Galeria de fotos – Oshkosh L-ATV
Ficha técnica – Oshkosh L-ATV
Motor: dianteiro, longitudinal, tricombustível, 400 cv e 120 kgfm estimado
Câmbio: automático 6 marchas, tração 4×4 sob demanda
Direção: hidráulica
Suspensão: duplo A, molas a ar, autonivelante (diant. e tras.)
Freios: disco ventilado (diant.), tambor (tras.)
Pneus: 395/85 R20
Dimensões: comprimento, 620 cm; largura, 250 cm; altura, 260 cm; peso, 7 toneladas*; tanque de combustível, 134 l
Desempenho: 0 a 100 km/h, 10 s; velocidade máxima de 110 km/h; consumo, 3,6 km/l; autonomia, 480 km (dados de fábrica)