Os segredos do Citroën C3 Aircross 2024 para ser grande e barato
SUV com metro quadrado mais barato do Brasil não abre mão do motor 1.0 turbo em nenhuma versão, mas é fácil entender como custa a partir dos R$ 109.990
Você já deve ter visto que o Citroën C3 Aircross tem preços entre R$ 109.990 e R$ 129.990, e dimensões de SUVs médios. É um carro enorme na faixa de preço do Fiat Pulse equipado com o mesmo motor 1.0 turbo. Mas agora é chegado o momento de conferir seus segredos para esse posicionamento de preço e como ele anda.
Com 4,32 m de comprimento, sendo 2,67 m de entre-eixos, e 1,72 m de largura, o novo SUV da Citroën tem o metro quadrado mais barato entre os SUVs vendidos no Brasil. Mas, tratando em termos imobiliários, é como um apartamento popular com três quartos. E tão raro quanto.
Mas a “planta” não é daquelas que representam um puxadinho. Do C3 hatch, ficaram as portas dianteiras, para-brisa, faróis e capô. As bitolas mais largas levaram a para-lamas mais largos, que por sua vez levou a um novo para-choque dianteiro com menos plástico preto fosco na base. Isso já ajuda a melhorar a impressão de porte.
O aumento do carro começa na seção traseira. O entre-eixos 11,5 cm maior que o de um C3 implica em portas traseiras muito maiores, que serão providenciais para acessar a terceira fila de bancos, assim como o teto mais reto. A traseira mais quadrada tem balanço traseiro cerca de 20 cm mais longo. Eis o segredo para o grande espaço interno.
Nosso primeiro contato é com aquela que será a versão topo de linha, o C3 Aircross Shine com sete lugares, que estreia apenas no primeiro trimestre de 2024. É quando a terceira fila de assentos estará disponível para todas as versões, elevando o preço de cada uma em cerca de R$ 8.000.
Para ter ideia, o assoalho da versão de sete lugares é diferente. É mais alto e, ao mesmo tempo que desloca o banco da segunda fileira cerca de 3 cm para a frente, obriga o estepe a ficar pelo lado de fora. No cinco lugares o estepe fica dentro e os assentos traseiros ficam rentes às caixas de roda. Mesmo com essa mudança, a Citroën conseguiu que todos os carros tivessem 493 litros de porta-malas: para o sete lugares, basta retirar os dois bancos extras.
Parece, mas não é difícil. Basta reclinar os pequenos assentos e puxar uma fita: eles saem com facilidade e pesam cerca de 8 kg, não exigem um grande esforço. Mas são bancos simples e molengos, pois todas as travas (de assento e encosto) estão no carro.
O espaço lá no fundão é ruim para qualquer adulto, que só vai suportar pequenos trajetos. Porque o assento é baixo, pois o espaço para a cabeça é limitado, e não há como colocar os pés por baixo do banco da frente. Na falta de Isofix para cadeirinhas ali, dá para dizer que é um assento para adolescentes.
Pelo menos lembraram de colocar duas portas USB a mais (em posição ruim, muito recuada), além dos porta-copos e da ventilação forçada no teto. Esse sistema de blower, que também existe na Mitsubishi L200, capta o ar mais fresco sobre os bancos dianteiros e joga para trás e promete reduzir a temperatura no fundão em até 4,5°C. Mas para ser efetivo precisa estar na velocidade mais alta, aumentando o ruído bem no ouvido do motorista.
Onde estão as economias?
O C3 Aircross Shine tem equipamentos exclusivos que não vão além do essencial para um SUV compacto, como faróis de neblina, bancos e volante forrados de vinil, rodas aro 17 e pneus 215/60, câmera de ré e piloto automático com limitador de velocidade.
Aos poucos você acaba percebendo tudo que mesmo o Shine não tem. É o caso do ajuste de profundidade da direção, chave canivete (continua com chave simples), airbags de cortina e frenagem de emergência ou qualquer outro sistema de segurança mais avançado, como monitor de pontos cegos ou alerta de saída de faixa.
Na prática, muda muito pouco a oferta de equipamentos na comparação com o C3. As diferenças principais são os airbags laterais e o quadro de instrumentos digital com tela colorida de 7 polegadas, mas só nas versões Feel Pack e Shine. O C3 Aircross Feel, o mais barato, tem só airbags frontais, o quadro de instrumentos de cristal líquido sem conta-giros e não tem espelhos elétricos ou sensores de ré.
Por dentro a percepção é a de estar em um C3. Tem a forração cinza nos bancos, a faixa horizontal dourada e com outra textura e o volante com botões do piloto automático. Os bancos dianteiros são diferentes, com melhor apoio lateral e tão mais altos que o ajuste de altura perde sua função. Mas não vai além disso. Nenhuma porta tem um lugar macio para apoiar o braço, por exemplo.
Os vidros elétricos traseiros, inclusive, continuam no console central em uma posição ruim para quem está na frente e ainda pior para quem vai atrás, pois o amplo espaço traseiro acaba afastando os passageiros de trás do seu direito de abrir os vidros.
Acho que ninguém esperava ver soluções e acabamento dos Xsara Picasso e Grand C4 Picasso no C3 Aircross. O quadro de instrumentos digital está até no lugar certo. O objetivo é entender como conseguiram colocar um carro com projeto mais moderno na faixa de preço do Chevrolet Spin.
Motor é novo na Citroën
Usar um motor antigo é um dos métodos mais comuns de baratear um carro, mas pelo menos a Citroën abriu mão disso. No Brasil, todos os C3 Aircross terão o motor 1.0 GSE Turbo com injeção direta flex, que gera 130 cv e 20,4 kgfm, e sempre está equipado com câmbio CVT com simulação de sete marchas. Um grande acerto.
O que um carro não tem também não pesa. O Aircross tem pouco mais de 1.200 kg, cerca de 150 kg a mais que um C3, e isso ajuda bastante no seu desempenho. Acelera sem dificuldade e o torque disponível cedo será importante quando carro estiver carregado. Outra boa notícia é que um leve tranco que o Peugeot 208 Turbo faz no anda-e-para foi eliminado neste primeiro Citroën com a mecânica 1.0 turbo.
A fabricante francesa declara um 0 a 100 km/h em 9,7 s com álcool e 9,9 s com gasolina.
A suspensão, com molas e amortecedores exclusivos, e um eixo de torção traseiro mais rígido, também ficou bem acertada. As bitolas alargadas em cerca de 3 cm, combinadas ao entre-eixos maior, deixam o C3 Aircross muito mais estável que um C3. Além disso, a movimentação da suspensão traseira é mais contida, não afunda tanto como em outros Citroën.
Isso não quer dizer que o Aircross seja duro. Mesmo em estradas de terra esburacadas o carro é capaz de filtrar muito bem tudo que os pneus e rodas sentem.
Mas duas coisas deixam a desejar em velocidades mais altas. A primeira é o peso artificial da direção elétrica, que deixa uma manobra de ultrapassagem, por exemplo, um tanto quadrada nas reações. Outra coisa é o ruído interno de pneus e de vento conforme a velocidade aumenta. Também devem ter economizado no isolamento interno.
Uma escolha pragmática
O Citroën C3 Aircross tem dois argumentos irrefutáveis. Ele é muito mais espaçoso que qualquer outro carro do segmento quando com cinco lugares e é o único SUV compacto com sete lugares. O consumidor que precisa de sete lugares realmente é carente de opções entre os R$ 121.000 do Chevrolet Spin LT7 e o Caoa Chery Tiggo 8, de R$ 190.000.
Quem realmente precisa de espaço talvez não se importe com a falta de um acabamento melhor ou de alguns equipamentos que encontraria em SUVs de mesmo preço. Além do mais, é mais possível instalar algum item como acessório do que procurar uma empresa que faz limusines para aumentar um entre-eixos.
O que a Citroën fez foi quase inventar um próprio nicho. Quase, porque o primeiro SUV compacto com tanto espaço e porta-malas foi o Renault Duster. Mas este teve 12 anos para ter uma versão de sete lugares e perdeu a oportunidade – assim como perdeu o interesse do consumidor. Resta saber se o tamanho desse nicho é suficiente para fazer do C3 Aircross um sucesso.