Após muita expectativa e apresentações graduais, é chegada a hora da Great Wall Motor estrear de vez no Brasil, onde será conhecida apenas como GWM. A importante fabricante chinesa já prepara sua fábrica, ex-Mercedes-Benz, no interior de São Paulo, onde produzirá veículos exclusivamente eletrificados a partir do ano que vem. Enquanto isso, a saída é importar seus lançamentos.
O primeiro desses é o Haval H6, um SUV médio que chega em dois tipos de carroceria com mecânica híbrida plug-in — ambos já dirigidos por QUATRO RODAS — e em versão única híbrida convencional, no qual andamos brevemente em visita à planta de Iracemápolis (SP).
De zebra a favorita
O século XXI teve, nos mais diferentes cenários, a China como protagonista de uma escalada impressionante. Do esporte à malha de trens-bala, o país foi de patinho feio para líder mundial, e obviamente há a ambição de fazer algo parecido com o mercado automotivo.
Quando os híbridos ainda eram carros de pouco volume, quase experimentais, as montadoras chinesas chegaram a uma difícil constatação, explica a revista científica MIT Tech Review: ou tentavam, sem sucesso, igualar as fabricantes clássicas nos carros a combustão ou apostavam no médio prazo, e começavam a desenvolver a expertise dos híbridos.
Com apoio pesado do Partido Comunista Chinês, a segunda opção foi seguida, e o resultado se pagou. Hoje, o mercado de elétricos da China é, de longe, o maior do mundo, com 6,8 milhões de unidades vendidas em 2022, contra apenas 800.000 dos Estados Unidos.
Essa explicação serve para reforçar a evidência de que virão das fabricantes chinesas os elétricos mais baratos do Brasil, como já ocorre com os três subcompactos a baterias vendidos aqui. Agora, essa revolução começa a atingir segmentos de maior volume, impressionando o mercado com os R$ 209.000 cobrados pela versão única do Haval H6 Premium HEV.
HEV, vale explicar, é um carro híbrido pleno, como um Toyota Corolla Cross Hybrid. Quer dizer que o carro se encarrega a pequena bateria que alimenta o motor elétrico, que entra em ação para dar suporte ao motor a gasolina nos momentos mais críticos. É uma ajuda e tanto para melhorar o desempenho e o consumo.
Em épocas de valores salgados, o modelo da GWM é relativamente barato. Ele custa menos que o Jeep Compass S (R$ 230.990) e que o Volkswagen Taos Highline (R$ 209.190), sendo ligeiramente mais caro que o Toyota Corolla Cross XRX Hybrid (R$ 207.790). Só o Corolla, porém, tem eletrificação equivalente e, mesmo assim, passa longe de igualar os 243 cv e 54 kgfm do Haval H6.
Qual o segredo?
Com preço relativo tão baixo, é natural que procuremos onde a GWM está economizando na qualidade; se isso realmente acontece, entretanto, ainda não foi possível identificar. Afinal de contas, o Haval H6 HEV tem praticamente o mesmo interior dos irmãos PHEV, cujo preço bate nos R$ 300.000.
No painel, se destaca a escolha por uma central multimídia e quadro de instrumentos flutuantes, com telas de 10,3’’ e 12,3’’. Ambas são de boa qualidade, com proteção que evita reflexo e marcas de dedos. De um lado, os displays cumprem todos os requisitos esperados de conectividade e serviço, com direito a Android Auto e Apple Carplay sem fio, inclusive. Do outro, quem já andou em mais carros chineses terá a sensação de que já viu os grafismos do H6 antes; uma personalização da interface do usuário elevaria ainda mais o nível interno.
Isso porque ele já é alto: o Haval H6 traz bancos confortáveis em vinil que imita couro, ventilação nos assentos dianteiros e poucos plásticos duros, quase sempre revestidos por tecidos macios. O console central, também à chinesa, usa com competência o espaço amplo, com seletor giratório de marcha e dois andares — o inferior ideal para guardar uma pequena bolsa, por exemplo.
O pacote é completado pela oferta de seis airbags e de nível 2+ de automação veicular: além do controle de cruzeiro adaptativo com Stop & Go (ou seja, que é capaz de parar o carro totalmente e retomar o movimento, útil para engarrafamentos), há frenagem automática de tráfego cruzado traseiro, monitoramento de pontos cegos, centralização de permanência de faixa, alerta de perigo de abertura de portas e sistema de estacionamento automático.
Feito pelos chineses, para os brasileiros
Em diversas interações com executivos e outros funcionários da GWM, faz-se questão de realçar a liberdade dada aos brasileiros, que puderam alterar vários aspectos do carro entre China e Brasil. Muito além da estética (na qual os cromados foram preteridos), essa tropicalização aparece onde é mais necessária: na mecânica.
O GWM Haval H6 Premium HEV tem comportamento de suspensão surpreendente, feita sob medida para as vias nacionais. Em um determinado momento, atacamos com força uma lombada e, ao invés de um tranco duro, a resposta foi uma compressão suave dos amortecedores, sequer chegando ao fim do curso.
Em ruas mal cuidadas, a rolagem da carroceria também é reduzida, assim como movimentos “pendulares” que, por exemplo, incomodam em nosso Jeep Compass de Longa Duração. Em termos de comportamento dinâmico, o que mais pode incomodar é a leveza da direção e a distribuição de peso entre os eixos, eventualmente facilitando uma saída de traseira que é contornada, sem perigos, pelos controles de estabilidade, mas acaba incomodando um pouco.
A união do motor 1.5 turbo com o elétrico promete performance emocionante, mas esse não foi o foco da nossa primeira impressão do carro. QUATRO RODAS assumiu o volante em uma maratona de consumo, pisando leve e economizando onde dava, a fim de atingir 22,6 km/l com o SUV. O que deu para notar é o silêncio do motor térmico e a suavidade nas transições do câmbio automático que mistura uma caixa automatizada de duas marchas com a conexão direta do motor elétrico no diferencial.
O que falta?
Quando os atributos do GWM Haval H6 HEV foram apresentados a um engenheiro diretamente envolvido com seus rivais declarados, a reação foi de incredulidade. “Sem dúvida estão com margem baixíssima para concorrer com a gente”, afirmou a fonte, que se gabou do pós-venda de sua montadora como trunfo.
Sem dúvidas é o grande desafio da chinesa daqui em diante, e mesmo quem elogiou a revelação dos Haval em nossas redes exibia seu temor com a rede da Great Wall. As regras do jogo não são justas, e a marca precisará se comportar não apenas igual, mas melhor que as rivais para ganhar a confiança do exigente e sempre ressabiado consumidor nacional.
Para tanto, um primeiro caminho é inovar na relação com o cliente, usando ações criativas como a venda dos carros através do Mercado Livre e entrega direto na casa do comprador, independentemente de sua cidade.
Correndo dobrado, a GWM também incluiu um pacote de “tranquilidade” na venda dos seus primeiros carros. Nele vão dois anos grátis de internet a bordo, fornecida pela Claro, proteção contra furos e rasgos dos pneus, serviço de concierge e uma proteção total, além dos defeitos de fábrica, para as baterias (a garantia contra problemas de fabricação vale por oito anos ou 200.000 quilômetros).
Até o meio do ano haverá 50 concessionárias pelo Brasil, o que, segundo a GWM, já é suficiente para cobrir todo o território. Eventuais paradas na oficina ainda serão contempladas com carro reserva para os clientes.
Se o futuro da mais nova fabricante do mercado nacional não for frutífero, o motivo para tanto ainda está além do que se vê em seus carros e planos de negócios.
Ficha técnica – Great Wall Haval H6 Premium HEV
Preço: R$ 209.000
Motor: dianteiro, transversal, gasolina, 1.499 cm³, turbo, 16V, injeção direta + um motor elétrico; 243 cv, 54,0 kgfm (combinados)
Câmbio: automático, 2 marchas (combustão)
Bateria: capacidade, 1,6 kWh
Direção: elétrica
Suspensão: McPherson (dianteira), multilink (traseira)
Freios: a disco nas quatro rodas
Pneus: 235/55 R19
Dimensões: comprimento 468,3 cm; largura, 188,6 cm; altura, 173 cm; entre-eixos, 273,8 cm; peso, 1.699 kg; porta-malas, 560 l
Consumo: urbano, 13,8 km/l; rodoviário, 12,0 km/l (Inmetro)