A partir de 2025, a Jaguar produzirá apenas automóveis 100% elétricos, mas, ciosa de sua rica história, a tradicional marca britânica quis despedir-se do F-Type com uma justa homenagem, organizando a sua derradeira viagem com um seleto grupo de jornalistas. Ao volante, cortamos a Espanha num roteiro de dois dias e 817 km entre o Mar Mediterrâneo e o Oceano Atlântico, da Catalunha ao País Basco.
Mais do que um test-drive típico, trata-se sobretudo de um merecido adeus ao esportivo que foi uma das grandes estrelas a desfilar na passerelle do salão de Paris de 2012.
A cantora Lana Del Rey emprestava a sua imagem ao esportivo felino, cantando Burning Desire na estreia mundial, na Cidade Luz, numa época em que o mundo estava longe de imaginar que a metamorfose para a propulsão elétrica iria se iniciar em três anos.
No cardápio, tivemos como opção as versões cupê e cabriolet da edição de despedida do F-Type, 75 e 75 R. Ela presta homenagem aos 75 anos dos modelos esportivos da Jaguar. Nesta edição derradeira, o F-Type é oferecido com motor 5.0 V8 com compressor, em versões de 450 cv (tração traseira) e 575 cv (tração integral). A série não é limitada em unidades, mas em tempo de produção: até o final de 2024, tendo quantas unidades o mercado demandar.
Para o roteiro, a Jaguar reservou a versão mais brava para o cupê e o felino mais domesticado na configuração com carroceria conversível. Um toque no botão vermelho com a palavra “Start” e os oito cilindros ganham vida, com uma celebração bem audível, um ronronar pulsante e genuíno de que no futuro iremos sentir falta.
Nesta edição de 75º aniversário, logo nas primeiras curvas nos damos conta de que sua agilidade não é tão afiada quanto a de um Porsche 911, e sim um GT preparado para longas viagens em vias rápidas, e que agrada também em sequências de curvas como as que enfrentamos assim que deixamos Barcelona a caminho dos Pirineus, a cadeia de montanhas na fronteira entre a Espanha e a França.
A aceleração é muito progressiva mesmo antes de 2.000 rpm (os 59,2 kgfm de torque máximo estão às ordens a 2.500 rpm) e o compressor dá aquele empurrão bem vigoroso sempre que lhe é exigida uma resposta mais forte. Os 4,6 segundos necessários para chegar a 100 km/h e os 285 km/h de velocidade máxima dão uma boa ideia do temperamento do felino.
Um toque no comando que altera os modos de dirigir, e a direção ganha mais peso, ao mesmo tempo que o conjunto motor-transmissão começa a evidenciar um sentido de urgência em tudo o que faz.
Curiosamente, iria jurar que não há diferença no amortecimento, depois de ter tentado repetidas vezes em maus pisos em curva e não ter detectado nenhuma variação. Ao final da primeira etapa, questionei Andy Jones, diretor de engenharia do F-Type, que concordou: “O carro tem amortecedores variáveis, mas admito que a crítica de que há pouca variação é algo que ouvimos diversas vezes por parte dos clientes”. Bom, se isso não foi corrigido até agora, a característica irá acompanhar o Jaguar F-Type pelo resto de seus dias (ou pouco mais de um ano).
À medida que a altitude aumenta, os Pirineus vão aparecendo majestosamente à nossa frente, enquanto vamos percorrendo o asfalto sinuoso com retas relativamente curtas e uma sequência de zigue-zagues. A 2.072 m de altitude, o ar mais rarefeito parece não afetar muito a “respiração” do V8 pela forma muito dinâmica com que responde às exigências do pé direito, coadjuvadas pela ação das borboletas de marchas atrás do volante.
Só com tração traseira, trechos um pouco molhados obrigam a alguma precaução para evitar escorregadas excessivas, apesar da eletrônica, que intervém quando as escapadas do eixo traseiro vão além de um limite aceitável e repõe o GT nos trilhos, uma ajuda importante sobretudo quando a estrada começa a estreitar.
Foi, por isso, interessante fazer uma parte do trajeto no cupê, que, além do acréscimo de potência, permitiu conferir as benesses que chegam com a tração nas quatro rodas, caso de mais rapidez em curva e mais segurança. A suspensão mais fechada nesta versão Type-R também colabora com o comportamento mais agressivo.
No segundo dia, com tempo seco e estradas mais largas, o conversível de tração traseira foi o parceiro ideal para deixar a traseira escapar moderadamente nas curvas mais fechadas, enquanto o nariz do carro apontava para o caminho a seguir, tudo sob a conivência do modo mais esportivo do controle de estabilidade e tração.
Não é exagero concluir que, quando os modelos da Jaguar com som, cheiro e vibração forem coisa do passado, bólidos como o F-Type serão muito apreciados – e valorizados. E, com essas linhas, certamente estamos diante de um futuro automóvel clássico, pelo design atemporal, tão apreciado hoje quanto há dez, quando começou a ser vendido.
Na Europa, o V8 conversível de tração traseira custa a partir de 129.100 euros (R$ 710.560). Já o cupê mais potente e com tração integral parte de 153.500 euros (R$ 844.850). A Jaguar Land Rover informa que algumas unidades serão destinadas ao Brasil até o fim do ano, mas ainda não há definição de preços (que terão acrescidos impostos, taxas diversas e custos de transporte e margem do revendedor local).
75 anos de celebração – Do XK120 ao F-Type
O primeiro esportivo da Jaguar foi um roadster desenhado pelo fundador da marca, Sir William Lyons. Construído na fábrica de Browns Lane em Coventry, na Inglaterra, e com as primeiras 240 unidades fabricadas com carroceria de alumínio feitas à mão, recebeu o motor XK 3.4 de seis cilindros em linha e 160 cv. Na época, a velocidade máxima de 193 km/h fez dele o carro de produção mais rápido do mundo. A vitória nos ralis alpinos de 1951 e 1952 foram alguns dos muitos sucessos do XK120.
Seguiram-se evoluções desse modelo (em 1951, 1954 e 1957), e no salão de Genebra de 1961 foi apresentado o Type-E. Seu estilo seduziu o mundo e tornou-se icônico, tendo sido o resultado da obsessão de Malcolm Sayer com a aerodinâmica. Com motor 3.8 de 265 cv, era capaz de acelerar de 0 a 96 km/h em 6,9 segundos. O Type-E foi também o primeiro Jaguar a receber o motor 5.3 V12 todo feito de alumínio, de 272 cv, que estabeleceu novos padrões em termos de suavidade e refinamento.
Depois do XJ-S (1975), do XK8 (1996) e do XK (2005), em 2012 o F-Type foi lançado com carroceria conversível de alumínio de quarta geração da Jaguar, suspensão de duplos triângulos sobrepostos e motores 3.0 V6 e 5.0 V8, ambos com compressor. A combinação de motor dianteiro e tração traseira proporcionava uma experiência intensa ao volante.
Veredicto Quatro Rodas
O F-Type tem estilo, motor e comportamento dinâmico de um autêntico GT fabricado pela Jaguar.
Ficha Técnica
Preço: 129.100 euros (75) e 153.500 euros (75 R)
Motor: gasolina, diant., longitudinal., V8, 5.000 cm3, compressor, inj. direta. (75/75 R) 450/575 cv a 6.000/6.500 rpm; 59,2/ 71,4 kgfm a 2.500/3.500 rpm
Câmbio: aut., 8 m., (75/75 R) tração 4×2/4×4
Direção: elétrica
Suspensão: duplo A (diant.), multi-braços (tras.)
Freios: disco ventilado nos dois eixos
Pneus: 265/40 R22
Dimensões: compr., 476,2 cm; larg., 184 cm; alt., 171 cm; entre-eixos, 287,4 cm; peso, 1.735/1.788 kg (75/75 R)
Desempenho*: (75/75 R) 0 a 100 km/h, 5,6/4,6 s; veloc. máx. de 250/300 km/h
*Dados de fábrica