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No embalo dos anos 70

O visual das motos de 40 anos atrás está de volta e traz o que há de mais moderno em tecnologia

Por Eduardo Viotti
Atualizado em 9 nov 2016, 11h52 - Publicado em 17 jun 2011, 21h53
No embalo dos anos 70

Nossa memória afetiva costuma ser muito indulgente com o passado. Ficam gravados bons momentos, sensações… Ninguém quer lembrar de percalços e dificuldades. As fábricas de motocicletas tiram partido disso e exploram o filão do saudosismo para atingir em cheio o coração de seus consumidores. Agora chegou a vez de os anos 70 entrarem na moda.

O último lançamento para comover esse público é a Kawasaki W800 2011. Apresentada no fim do ano passado no exterior, não tem data para chegar ao Brasil. A W800 é homenagem da marca ao modelo W1 de 1966, moto que marcou o ingresso da Kawasaki no mundo dos motores de quatro tempos. A W1 tinha 650 cc e seu bicilíndrico paralelo vertical refrigerado a ar incorporava tecnologia adquirida da inglesa Triumph.

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A Kawasaki W800 é uma evolução da W650 de 1999, a primeira releitura da W1, e amplia a cilindrada para 773 cc, adotando comando único no cabeçote (SOHC) para as quatro válvulas por cilindro e alimentação eletrônica.

Atinge 48 cv de potência a 6500 rpm e torque de 6,1 mkgf a 2500 giros. Alimentado por injeção multiponto, esse motor oferece torque abundante em todas as faixas, velocidade acima dos 170 km/h e aceleração de 0 a 100 km/h em menos de 6 segundos, de acordo com a fábrica. O consumo médio indicado é de cerca de 15 km/l.

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Mecanicamente, é uma moto atual, sem arroubos de tecnologia embarcada além do gerenciamento de motor (injeção multiponto e ignição digital). Seu ponto alto é mesmo o visual: farol redondo, motor cromado, para-lamas metálicos igualmente brilhantes, guarda-barros sanfonados de borracha na suspensão dianteira – e os escapes com saída de ponteira bem afilada, chamada de peashooter, canudo que é uma espécie de zarabatana que as crianças inglesas usam para brincar de assoprar ervilhas secas umas nas outras.

Não há dúvida de que a Kawasaki W800 cumpre seu objetivo de conquistar corações e mentes de motociclistas de meia-idade – e até mesmo de jovens interessados em objetos de época.

Excetuando-se os scooters (motonetas), os primeiros a adotar o estilo retrô como apelo de vendas, e as motos custom, que têm como característica básica de sua proposta a ideia da rebeldia dos anos 60, a Kawasaki W800 vem encontrar outras motocicletas que buscam na segunda metade do século passado a inspiração de estilo.

TIRA DE COURO As marcas europeias capricham na caracterização setentista: Triumph, MotoGuzzi (do grupo Piaggio) e Ducati têm modelos clássicos, com o mesmo apelo visual de 40 anos atrás.

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A Moto Guzzi lançou no fim de 2010, mais ou menos à mesma época da Kawasaki W800, a V7 Racer, uma edição especial limitada de sua igualmente saudosista V7 – uma moto exatamente fixada em design e técnica lá no início dos anos 70.

A V7 Racer é uma homenagem às máquinas de corrida da época, montando placas para números na carenagem de farol e nas laterais, sob a rabeta. O tanque cromado é o ponto alto do modelo, encimado por uma tira de couro – o acabamento geral é espetacular. Essa edição limitada vai ser praticamente devorada por colecionadores europeus, a quem é destinada, afinal.

A Piaggio, fabricante desse modelo e também dos scooters Vespa, entre outras marcas (como a Aprilia), vem sendo objeto de especulações quanto à sua chegada ao Brasil através de associações com fabricantes instalados, mas até o fechamento desta edição nada havia sido confirmado. Pena, seria uma boa chance de ver em nossas ruas essa recém-lançada roqueira vintage.

Mecanicamente, a Guzzi V7 Racer é similar à versão Café, modelo ainda mais saudosista que nunca saiu de linha. Ela adota o tradicional bicilíndrico de 744 cc em V a 90 graus colocado transversalmente ao chassi. Claro, tem toda a tecnologia de injeção e ignição eletrônicas, até para atender aos rigorosos ditames da lei antipoluição europeia. Esse propulsor desenvolve 48,8 cv máximos a 6800 rpm e torque de 5,6 mkgf a 3600 rpm.

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Se o motor não parece capaz de grandes arroubos esportivos, a suspensão Marzocchi dianteira e os amortecedores traseiros Bitubo, completamente ajustáveis, além dos pneus Pirelli Demon Sport montados em aros pretos com raios cromados, parecem mais agressivos. O sistema de freios aplica um disco Brembo de 320 mm com pinça de quatro pistões e traseiro de 260 mm com pinça de pistão simples.

A Ducati SportClassic GT 1000 não é tão nova, nem foi lançada há poucos meses, mas disputa exatamente o mesmo segmento que a MotoGuzzi V7 e a Kawasaki W800. Ela foi apresentada no Salão de Tóquio em 2003 e comercializada apenas a partir de 2005 (anomodelo 2006). A SportClassic é, assim, uma precursora, saída das pranchetas do genial projetista Pierre Terblanche, chefe de design da marca italiana.

O motor é o tradicionalíssimo bicilíndrico em V a 90 graus desmodrômico da marca italiana, refrigerado a ar e óleo, com duas velas de ignição por cilindro, chamado de DS9. Com 992 cc, apresenta potência máxima de 91 cv a 8000 rpm e torque alto de 9,3 mkgf a 6000 rpm. O chassi de treliça, marca registrada das Ducati, não poderia faltar, bem como os equipamentos de grife, como freios Brembo e suspensões Marzocchi. Os semiguidões clip on, ao estilo Tomazelli, e a oferta de cores sólidas e chapadas, sem recortes (preta, vermelha e amarela), completam a caracterização de época, bem à moda da década de 70.

As motos ao estilo dos seventies continuam a pipocar aqui e ali. As inglesas Triumph Bonneville, Bonneville T100, Thruxton e Scrambler adotam todas a mesma base mecânica – e caracterizações temáticas bem diferentes. A Bonneville básica com roda de liga remete diretamente aos anos 70, época de grande sucesso do modelo, lançado entretanto bem antes, em 1959.

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A Thruxton 900, versão lançada em 2005, traz o tradicional e robusto motor bicilíndrico vertical de 865 cc e certa sugestão esportiva. A Scrambler é uma versão que lembra as precursoras do fora de estrada e parece saída diretamente de um filme de Steve McQueen, ele próprio um ícone da época (morreu aos 50 anos em 1980).

Os anos 70 estão presentes em uma série imensa de motocicletas menos badaladas e muito pouco conhecidas do público brasileiro. As fábricas japonesas volta e meia arriscam um revival da época em que começaram a conquistar o mundo das duas rodas, derrotando as marcas europeias e norteamericanas em casa.

A Honda CB 1300F, maravilha com motor quatro em linha cuja importação foi recentemente suspensa pela Honda ao Brasil, continua incólume nos mercados externos, com sua cara de fim da década de 70, farol redondo, amortecimento traseiro bichoque e rabetinha puxada. A marca alada também mantém em produção no exterior uma versão da Shadow que trafega entre uma custom e uma street saudosista, a RS, com pintura que remete a 40 anos atrás e cilindradas de 400 e 750 cc em seu conhecido V2 a 52 graus, refrigerado a água.

A Yamaha insiste com sua monocilíndrica SR 400, produzida ininterruptamente desde 1978 e modernizada tecnicamente, mas não estilisticamente. Vende muito no Japão, onde as motos com cilindrada de até 400 cc são privilegiadas com menor carga tributária pela lei.

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A Suzuki vende nos EUA a TU 250, também monocilíndrica e igualmente caracterizada como uma moto de meiaidade, cheia de cromados e um confortável visual déjà vu. No Brasil, fabrica a Intruder 125, uma simpatia de motinho, que mais parece saída da infância de um cinquentão motorizado.

O mundo das motos vintage que continuam em linha de montagem não para por aí e retrocede décadas no tempo. A Royal Enfield faz toda uma gama de monocilíndricas com remissão clara a modelos dos anos 50 e 60 e as russas Ural e Dnepr são réplicas das BMW utilizadas na Segunda Guerra Mundial pelas tropas alemãs.

Até os chineses, caso da SYM 150 Classic, saída diretamente dos anos 70, e de inúmeros scooters na linha das Vespa, investem no saudosismo. A nacional Dafra Super 100 (e a 50 cc também) são despretensiosamente vintage, assim como a periclitante Sundown Hunter 100 – a empresa está enfrentando algumas dificuldades de mercado. São velhinhas autênticas – e novas.

A lista seria extensa, mas a curiosidade são os lançamentos recentes que retrocedem estilisticamente no tempo. Dirigir uma moto vintage nova não é nenhum anacronismo: com tecnologia atual, esses modelos oferecem segurança e confiabilidade – e resgatam a simplicidade pura dos objetos mecânicos verdadeiramente apaixonantes. Um guidão, um banquinho e um violão. Ops! Um motorzão, claro.

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