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Lição de moral da Suécia sobre airbag faria bem à Mantega

"Nenhuma perda de vida é aceitável" é o lema de programa sueco - levado a sério - que quer baixar a zero mortes envolvendo veículos

Por Marco Prates, de Exame.com
Atualizado em 9 nov 2016, 12h55 - Publicado em 13 dez 2013, 18h21
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    “Não há justificativa moral para nenhuma morte no trânsito”. A frase é de um vídeo institucional sueco sobre o programa Visão Zero, desde 1997 vigente no país escandinavo. O lema desta estratégia – que orienta as ações da indústria de inovação e de automóveis da Suécia, assim como do governo – é que “nenhuma perda de vida é aceitável” (“no loss of life is acceptable”, em inglês).

    É de se supor que a seriedade com que o programa foi levado pela nação nórdica – e posteriormente replicado pela maior parte da União Europeia – faria corar o governo brasileiro diante dos últimos movimentos políticos observados por aqui.

    Na quarta, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que pode ser postergada a obrigatoriedade de que 100% dos veículos nacionais saiam da fábrica com airbag duplo e freios ABS, itens de comprovada eficácia para salvar vidas no trânsito (veja benefícios ao final).

    Em 2011, 43 mil pessoas perderam a vida em acidentes nas vias do Brasil, segundo o Ministério da Saúde.

    “Há uma preocupação com emprego, e uma outra preocupação é com o preço, que vai subir”, disse o ministro ao Jornal Nacional, ontem. A resposta final sairá na próxima 3ª feira.

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    O governo em parte age pelo lobby declarado de sindicatos que temem demissões – pelo menos três populares modelos teriam fabricação suspensa por terem concepção tão antiga que não merecem adaptações às novas normas (Uno Mille, Gol G4 e Kombi) – e em parte age com medo que o aumento de preços, calculado entre R$ 1 mil e R$ 1,5 mil por automóvel, pressione a inflação em 2014, ano eleitoral.

    Diante disso, o programa sueco continua com potencial de causar constrangimentos.

    “Alguns argumentam que esta alta tolerância (com as mortes) é o preço que temos que pagar pela mobilidade. Nós discordamos”, diz o mesmo vídeo citado ao início desta reportagem. Substituída a palavra “mobilidade” por “controle da economia”, a crítica poderia ter destinatário certo.

    Segundo o Mapa da Violência 2013, estudo da OCDE, grupo que reúne nações ricas, mostra que países que adotaram seriamente esta “visão zero” de mortes no trânsito diminuíram em 50% o número de vítimas desde 1970, mesmo com a frota tendo aumentado fortemente no período.

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    No Brasil, em 1980, foram 20,2 mil mortes. Em 2011, como já mencionado, mais que o dobro disso.

    A decisão do governo brasileiro – alheia aos benefícios de equipamentos tidos como exigências mínimas em países desenvolvidos – é ainda mais impressionante porque a resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que regulamentou a medida, é de 2009.

    Ela permitiu às montadoras nacionais que escalonassem a produção com esses itens de 30%, em 2012, para 60%, em 2013, até os supostos 100% do ano que vem.

    Todas as fabricantes afirmam não ter influenciado no recuo. Independentemente disso, o fato é que os parques industriais já estão prontos para que todos os modelos saiam com airbags e ABS de série, alegam elas próprias. Se a resolução for postergada, no entanto, o mais provável é que as empresas reavaliem as vantagens econômicas de adotá-los em toda linha.

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    Benefícios

    A NHTSA, agência que cuida da segurança no trânsito nos Estados Unidos, calculou em 2009 que 54% das vidas em acidentes poderiam ser salvas com a adoção conjunta de airbags frontais e cintos de segurança pelos motoristas, embora o cinto por si só já apresente eficácia de 48%.

    Um outro levantamento do Centro de Experimentação e Segurança Viária (Cesvi), de 2008, afirma que 3,4 mil vidas poderiam ter sido salvas no Brasil entre 2001 e 2007 se todos carros tivessem airbags.

    Enquanto as bolsas infláveis atuam quando o pior já aconteceu, o ABS impede as rodas de travarem durante freadas bruscas.

    “Você vê colisões em rodovias onde a pessoa teve as rodas bloqueadas em uma trajetória muito grande e veio a colidir. Se tivesse ABS, isso poderia ser evitado”, afirma Gerson Burin, analista técnico do Cesvi.

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    Na avaliação do centro de pesquisa de segurança automotiva, qualquer medida que venha na contramão de prover mais segurança aos veículos nacionais – já chamados de “mortais” em reportagens internacionais – é um retrocesso.

    Ter airbags frontais e ABS nem deveria ser algo a se gabar: na Europa, carros baratos já saem da fábrica com airbags laterais, enquanto nos Estados Unidos, não se faz nenhum sem controle eletrônico de estabilidade, um dos itens de maior importância para evitar colisões.

    Mentalidade

    Tudo considerado, talvez a maior lição da Suécia nas questões viárias seja relacionada à mentalidade com que se tratam problemas e se buscam soluções.

    Para mostrar isso, vale lembrar uma situação clássica e repetitiva: a cada feriado em que ocorrem dezenas de mortes nas estradas brasileiras, seguem-se uma série de entrevistas com policiais nas rádios e TVs do país.

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    Na maioria das vezes, os agentes culpam a imprudência dos motoristas pelo alto número de tragédias.

    “Os sistemas de transporte tradicionalmente colocam a responsabilidade pela segurança nos usuários. A Iniciativa Visão Zero coloca esta responsabilidade no projeto do sistema”.

    A frase acima é, mais uma vez, do programa sueco. Talvez esteja na hora do governo brasileiro também almejar – ao menos como princípio – que as mortes envolvendo automóveis se limitem a zero.

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