Quando comprou seu primeiro caminhão, Antonio Soares Ribeiro, de 82 anos, pensou estar fazendo um investimento para a vida, quase um casamento. Mas as coisas não correram como o esperado e a garagem acabou sendo ocupada por um segundo caminhão.
Tratava- se de um Ford F-600 1959, comprado zero-quilômetro. Com ele a história foi diferente. “Ele foi um amigo, um irmão, nunca me deixou na mão. Eu mesmo fazia sua manutenção”, diz Antonio, que se orgulha de o “Efão”, como ficou conhecido, ter rodado cerca de 1 milhão de quilômetros.
Não foi o cansaço que aposentou o Efão, mas a crise do petróleo. Com a alta dos preços, ficou inviável trabalhar com um caminhão de motor V8 a gasolina. Porém, se ele cedeu o batente aos mais jovens movidos a diesel, em compensação passou a ser usado em passeios de fim de semana. Aliás, foi nele que o filho e os três netos de Antonio aprenderam a dirigir.
A paixão pelo caminhão e consequentemente pela marca foi passada de pai para filho e chegou à terceira geração. “Desde a compra do F-600 somos fiéis aos Ford”, diz o neto Antonio Carlos Ribeiro Filho, de 21 anos, que hoje tem um Galaxie 500 de duas portas 1966 e um Fiesta 2010. Não é por menos que a família Ribeiro é conhecida como “Família V8” nos encontros de antigomobilistas pelo país.
A ligação é tal que eles construíram uma casa em uma condomínio fechado em São José do Campos (SP) apenas para abrigar a coleção de automóveis e caminhões antigos da marca americana, que soma dez veículos antigos.
Na sala fica estacionado um Maverick GT 1974 branco e a decoração do ambiente é toda inspirada na fabricante, com uma placa imensa da Ford pendurada na parede. Detalhe: veículos de outras marcas são impedidos de colocar suas rodas nessa propriedade dos Ribeiro.
Até a festa de debutante da neta caçula, há dois anos, teve como tema… Ford! “Na decoração do salão estavam para-choques de Galaxie e o topo do bolo era uma miniatura do caminhão F-600 do meu avô. O mais legal é que fora da festa também só se via Ford, pois apenas os carros da montadora poderiam estacionar dentro do condomínio em frente ao salão de festa. Foi maravilhoso”, diz Ana Laura Ribeiro, que ganhou como presente-surpresa do avô um Galaxie LTD 1976.
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Pelo menos no que se refere à marca de carros, engana-se quem imagina que fidelidade é um valor fora de moda. Segundo pesquisa relacionada a hábitos de consumo, divulgada pelo Ibope , 72% dos proprietários de carros que pretendem comprar automóveis nos próximos 12 meses afirmam que, quando encontram uma marca de que gostam, tendem a permanecer fiéis a ela.
O empresário Paulo Gabarra, 54 anos, foi influenciado pelo pai a admirar os carros fabricados pela General Motors e tornou-se completamente fiel à marca. “Ganhei de presente de 18 anos um Chevette do meu pai e a partir daí a paixão foi inevitável”, diz Gabarra, que com o pai tem uma coleção de sete Chevrolet antigos. “Meu pai queria ter um representante de cada década, dos anos 20 até os 60. A ideia era ter uma referência da evolução dos modelos com o passar dos anos”, afirma.
Paulo conta que o pai – assim como ele e seu irmão, José Carlos – teve em sua maioria modelos da Chevrolet. Com um detalhe curioso: Darcy Gabarra, 89 anos, sempre equipou seus carros com a buzina retirada de seu primeiro Chevrolet, um 1928 conversível, modelo que mantém até hoje em sua coleção, restaurado na forma exata do seu primeiro veículo.
Amante dos besouros
No entanto, há casos de tamanho apego que o amor à marca não basta. É preciso canalizar a paixão para determinado modelo. É o caso do técnico de informática Aluizio Lemos, de 50 anos, que só teve Fusca. “Eu me apaixonei de tal forma que nunca mais tive outro”, diz Lemos, dono de um exemplar de 1955 e que afirma ter tido dez Fusca.
“É o meu carro do dia a dia e nem penso em ter um carro moderno, muito menos a versão atual do Fusca”, afirma Lemos, que é diretor do Fusca Clube do Brasil e administrador do Fórum Fusca Brasil. “Dedico minha vida ao modelo e normalmente tenho dois deles na garagem, um original e outro com alguma personalização.”
Lemos está longe de ser um caso isolado de monogamia emblemática. O representante comercial Gilson Peixe, 48 anos, é outro que só pensa em Fusca quando o assunto são quatro rodas. Ele se dedica à restauração de Sedan VW, como era chamado o besouro antes de se tornar o Fusca, principalmente da década de 50, quando ainda eram importados da Alemanha.
“Tenho até hoje meu primeiro Fusca, ano 1972. Desde então me dedico à preservação da história do modelo”, diz Peixe, que em seu galpão em São Paulo tem 11 unidades e também uma Kombi 1961 e um Karmann Ghia, que comprou pelo prazer da restauração. “Eu mantenho a originalidade dos carros, mas substituo os motores por mais modernos.”
O editor de fotografia Sidney Lopes também só tem olhos para uma marca, igualmente europeia. “Já tive 36 carros da Fiat desde o primeiro, um 147”, diz Lopes, que sempre indica modelos da montadora italiana para amigos e familiares. “Em média chego a ajudar a Fiat a vender uns 20 carros por mês na concessionária em que sempre compro.”