A viagem de 5.500 km em uma VW Quantum até a AutoClásica, na Argentina
Para quem gosta de carro e de viajar, a AutoClásica, na Argentina, é um bom motivo para fazer as malas.

Maior e melhor evento de automóveis antigos da América Latina, a AutoClásica é organizada desde 1998 pelo Club de Automóviles Clásicos e realizada anualmente no Hipódromo de San Isidro, em Buenos Aires, sempre na primeira quinzena de outubro.
Por se tratar do único concurso de elegância sul-americano reconhecido pela Fédération Internationale des Véhicules Anciens (FIVA) a presença de colecionadores brasileiros é cada vez maior, seduzidos pelo alto nível dos veículos expostos e pela organização impecável.
Outro fenômeno percebido pela organização: o número de brasileiros que prestigiam o evento conduzindo seus automóveis antigos também aumenta a cada ano. E em 2024 decidi integrar essa estatística.


A ideia tomou forma em 2023, quando vi meu amigo Reynaldo Scalco Junior ser calorosamente recebido na AutoClásica com seu Chevrolet Opala 1980. Troquei informações com o Reynaldo e esbocei o primeiro roteiro da Expedição Tala Larga (@tala.larga).
Quatro dias de viagem, saindo de Piracicaba (SP), cruzando o Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e o norte do Uruguai até chegar a Buenos Aires. E apenas três tripulantes: eu e os parceiros Luiz Steilein Filho e Carlos Almeida.

Antigomobilistas e amigos há mais de duas décadas, os dois compartilhariam o volante da minha VW Quantum 1996, que já acumulou mais de 1 milhão de quilômetros desde o dia em que foi morar na minha garagem, no longínquo ano de 1999.



Primeira providência, revisão do carro: a Quantum ganhou um novo jogo de pneus e foi realizado um pente fino em seus diversos sistemas, como freios e parte elétrica, para evitarmos surpresas.
Também fomos obrigados a remover o engate para reboque: a “Ley Nacional de Tránsito” da Argentina proíbe qualquer acessório além do comprimento total do veículo. Exige também extintor de incêndio e pelo menos dois triângulos de sinalização.
Ao contrário do que muitos pensam, cambão de reboque, colete refletivo e kit de primeiros socorros não são exigidos por lei. O mesmo não pode ser dito da chamada Carta Verde, seguro que garante indenização a terceiros e que deve ser solicitado ainda no Brasil, a qualquer corretor local (custou US$ 4,63). Convém também contratar um seguro-viagem, para as pessoas (é opcional).


Se o veículo não estiver em nome de um dos ocupantes, será necessário providenciar uma autorização autenticada do proprietário. Para garantir a validade do documento solicite ao cartório um “apostilamento de Haia”, certificação válida nos países signatários da Convenção de Haia.

Saímos de Piracicaba (SP) no dia 5 de outubro (sábado) e percorremos 472 km até Curitiba (PR). Na manhã seguinte, passamos por Rio Negro (PR), Mafra (SC) e após rodar 580 km chegamos a Passo Fundo (RS), local onde o Auto Club Veículos Antigos preparava suas raridades para a mesma viagem.
O terceiro dia foi o mais crítico: 520 km de chuva incessante entre Passo Fundo e Sant’Ana do Livramento. Sem ABS e controle de tração, nossa segurança dependia exclusivamente de nossas habilidades.

Não há barreira física entre Sant’Ana do Livramento e a cidade uruguaiana de Rivera. O turista deve dirigir-se ao Shopping Siñeriz, registrar sua saída no posto da Polícia Federal localizado ali e no mesmo salão formalizar a entrada no posto de Imigração Uruguaia (ambos funcionam 24h). Uma vez em terras uruguaias, não há cabines de cobrança manual nos pedágios locais: o cadastro no sistema automatizado pode ser realizado em casas de câmbio, no aplicativo Telepeaje (telepeaje.com.uy) ou diretamente no posto de atendimento na praça de pedágio Manuel Diaz (a primeira que surge no roteiro).
De Rivera a Paysandú foram 360 km de asfalto perfeito, sempre com farol baixo aceso (obrigatório). Cruzamos a fronteira com a Argentina em Colón: almoçamos e completamos o tanque com a perfumada (para quem gosta) gasolina argentina, mais barata que a nossa e com apenas 12% de etanol.
Após percorrer quase 2.000 km com a gasolina argentina, não sentimos diferença no consumo, mas a mudança (para melhor) na resposta do acelerador é sensível.
De Colón a Buenos Aires são 330 km pela Ruta 14: três horas e meia de pista duplicada, bem conservada e com poucos radares e pedágios. Guardamos a Quantum em um estacionamento defronte à Comisaria 4 (equivalente a um distrito policial) e nos dirigimos ao Santos Manjares, um dos melhores restaurantes de Buenos Aires. Prepare-se para ganhar uns quilos: Buenos Aires é notória pela gastronomia de suas pizzerías, bodegóns e parrillas.
Como chegamos na terça-feira (08/10), ficamos com a quarta-feira livre para comprar artigos de couro na Calle Murillo e conhecer o museu do Automovil Club Argentino: o acervo é notável e a entrada é franca.
A AutoClásica sempre começa em uma quinta-feira: por ser o dia menos cheio, é o melhor para quem gosta de tirar fotos e produzir conteúdo digital. Em 2024, o ingresso custou AR$ 25.000, o equivalente a US$ 21,37 na cotação do dia 12/10.
E vale cada centavo: quem paga tem a oportunidade única de ver, em um único dia, automóveis que a maioria da população mundial não verá na vida inteira.
Durante a premiação da AutoClásica (no sábado) o amigo Miguel Bottini (do Automovil Club Argentino) nos apresentou a Fernando Barragán, presidente da Asociación Amigos del Paseo Juan Manuel Fangio.

Miguel contou a Fernando que eu era repórter de QUATRO RODAS: naquele momento fui imediatamente convocado a conhecer o Museo Fangio, localizado em Balcarce, terra natal de Juan Manuel Fangio.
No domingo, percorremos 414 km pela Autovia 2 (duplicada e pedagiada) até Balcarce. Fomos recebidos com todas as honrarias por Luis Carlos Barragán, pai de Fernando, amigo pessoal de Juan Manuel Fangio e um dos fundadores do museu.
Logo ao entrarmos no museu, Luis Carlos orgulhosamente nos mostrou o troféu que Fangio recebeu da revista em 1981, ano em que foi eleito o melhor piloto de todos os tempos. Naquele momento, compreendi a reverência de nossos hermanos pela QUATRO RODAS.
Retornamos a Buenos Aires pela Ruta 29, sem pedágios, sem radares e com uma pista simples de asfalto muito bem conservado. No dia 14 de outubro, iniciamos nossa viagem de quatro dias de volta a Piracicaba: a Expedição Tala Larga será realizada novamente em 2025 e você está convidado a participar dela.
Tudo que você precisa saber para ir de carro para a Argentina
Itens obrigatórios:
- Extintor de incêndio
- Mínimo de dois triângulos de sinalização
- Seguro Carta Verde
- Adesivo traseiro com limite de velocidade (picapes e demais utilitários)
- Autorização do proprietário (quando não estiver presente)
ITENS PROIBIDOS
Qualquer acessório que ultrapasse os limites do para-choque: engate de reboque fixo, quebra-mato, guincho etc.
DICAS
- CNH não é aceita como documento. Tenha em mãos o RG original ou passaporte.
- Em algumas regiões são frequentes os relatos de abordagens policiais exigindo itens não obrigatórios como cambão de reboque e colete refletivo. Vale a pena imprimir a Ley Nº 24.449 (Ley Nacional de Tránsito y Seguridad Vial) e guardá-la no porta-luvas, caso precise argumentar com os agentes.
- O artigo 37 determina que os documentos não podem ser retidos pelos agentes. O 40 f estipula os itens obrigatórios. O art. 47 determina o uso do farol baixo nas rodovias.
- Carregue dinheiro em espécie: dólares e reais são aceitos no Uruguai e na Argentina, mas o mais indicado é procurar uma casa de câmbio e trocar pela moeda local.
- O Uruguai é um país caro. Mas a Argentina continua sendo um destino barato.
- Saia do Brasil com um chip de celular pós-pago com roaming internacional: nada pior que perder horas preciosas de lazer em busca de um chip compatível com seu celular.
Números da viagem
- Km percorridos no Brasil: 3.189 km
- Km percorridos na Argentina: 1.986 km
- Km percorridos no Uruguai: 359 km
- Total de km percorridos: 5.534 km
- Abastecimentos: 14
- Gasolina: 535 litros
- Gasto total com gasolina: R$ 3.143,67
- Média geral de consumo: 10,34 km/l
- Valor total dos pedágios: R$ 299,64