De um lado havia a correia dentada, simples, leve e silenciosa mas que exige sua troca em intervalos entre 60.000 e 100.000 km. Do outro, havia a corrente metálica de comando, resistente e com durabilidade superior a 200.000 km, porém mais pesada e muito mais ruidosa. As diferenças se concentram em manutenção, custo e ruído, mas a indústria criou outra opção.
Correias dentadas banhadas a óleo eram promissoras. Ainda são silenciosas e leves, mas sua durabilidade até supera as correntes metálicas, chegando aos 240.000 km ou 15 anos por estarem em contato com o óleo do motor. Então por que o brasileiro está fugindo delas?
Quem introduziu esse sistema entre os carros nacionais foram os Ford Ka três-cilindros 1.0 em 2015, mas a Ford também usou a correia banhada a óleo no motor três-cilindros 1.5 Dragon (Ka e EcoSport), no 1.0 EcoBoost (Fiesta) e ainda usa no motor 2.0 turbodiesel da Ranger. Nos carros de passeio 1.0, a durabilidade é de 10 anos ou 240.000 km e nos 1.5 é de 160.000 km, mesma durabilidade da correia da Ranger.
Os Citroën C3 e Peugeot 208 com motor três cilindros 1.2 também tinham correia dentada banhada a óleo, mas com durabilidade de 80.000 km – a mesma das correias dentadas tradicionais dos outros motores usados por eles.
Quem entrou nessa por último foi a Chevrolet, com os novos motores da família CSS, 1.0 aspirado, 1.0 turbo e 1.2 turbo, todos de três cilindros e que começaram a se espalhar pela linha a partir de 2019. Sua correia banhada a óleo tem durabilidade prevista de 15 anos ou 240.000 km.
A intenção era boa: na maioria dos casos, os primeiros proprietários dos carros nem sequer precisariam se importar com a durabilidade da correia dentada. Mas existe um fator chamado “Brasil”.
O que está matando a correia dentada banhada a óleo?
Essa tecnologia coloca a correia de borracha em contato direto com o óleo do motor. Para que não exista uma interação prejudicial entre os dois, os fabricantes desenvolveram aditivos para o óleo lubrificante não agredir a correia dentada.
Na teoria, é simples: bastaria o proprietário seguir à risca a especificação do óleo preconizada no manual do carro para não ter problemas, ou levar o carro para a revisão apenas na concessionária – que é obrigada a usar o óleo certo. Não basta acompanhar a viscosidade, mas também a norma SAE e eventuais padrões de aprovação do fabricante.
- Para os Chevrolet, o óleo usado tem que ter o selo de aprovação Dexos 1 Gen 2.
- Para os Ford Ka e EcoSport com motor três cilindros, a Ford recomenda óleo SAE 5W-20 que atenda às normas WSS-M2C948-A ou WSS-M2C948-B, e os fabricados antes de 2018 também podem usar os SAE 5W-30 com aprovações WSS-M2C913-C ou WSS-M2C913-D. Há outras marcas compatíveis, mas o óleo Motorcraft SAE 5W20 (WSS-M2C948-B) da própria Ford evita erros.
- Para os Citroën e Peugeot com motor 1.2 Puretech é exigido o lubrificante que tenha a certificação PSA B71 2302.
Na prática, porém, nem sempre isso é observado na hora da troca de óleo. Pensando no custo final do serviço, o mecânico ou o próprio cliente se limitam a escolher o óleo do motor apenas pela viscosidade. Era o que se fazia com motores mais antigos, afinal, e não dava problemas.
Também é importante observar que os Chevrolet Onix e Tracker e os Ford Ka e EcoSport são ou eram muito comprados por locadoras. E são poucas aquelas que enviam seus carros para serviço em concessionárias.
Em geral, as locadoras contratam oficinas para executarem a manutenção preventiva nos seus carros. Ou enviam o material necessário (óleo e filtros) para o estabelecimento ou estabelecem um custo limite. A manutenção é feita mas, muitas vezes, com o que há de mais barato. Como esses carros são revendidos antes dos 50.000 km, caem no mercado de usados como bombas prontas para explodir.
É o uso do óleo errado o que está arruinando a imagem dos Chevrolet e dos Ford com estes motores.
A consequência dessa economia de trocados é que o uso de um óleo sem aditivos ou propriedades que protegem a correia dentada faz com que a correia inche, esfarele ou até mesmo desfie dentro do motor do carro.
Uma correia convencional estoura se não é trocada no tempo certo, levando ao atropelamento das válvulas. Uma correia úmida raramente estoura (seus dentes são revestidos de aramida, um material mais resistente). Contudo, basta que os pedaços da correia entupam os dutos de óleo, a bomba de óleo ou o pescador do cárter para que o lubrificante deixe de circular pelo motor. A luz de óleo do motor chega a acender, mas se for ignorada o motor acaba fundindo em poucos quilômetros.
Uma utilização de óleo errado no motor já seria o suficiente para condenar a vida útil da correia dentada. Então, se você comprou algum destes carros usados e não tem como garantir que utilizaram apenas o óleo certo no motor, é melhor prevenir: como é necessário remover a tampa de válvulas para inspecionar a correia, avalie se é o caso antecipar a troca da correia dentada, do filtro de óleo e também da bomba de óleo.
Nossas experiências com correia banhada a óleo
Tivemos dois destes carros com correia banhada a óleo no testes de Longa Duração: um Ford Ka 1.0 2025, que rodou 60.000 km, e um Chevrolet Onix Plus 2019, que rodou 100.000 km em teste. Ambos seguiram à risca o plano de revisões das respectivas fabricantes e fizeram todos os serviços em concessionária dentro dos prazos corretos. Nos dois casos, os carros foram completamente desmontados e não tiveram qualquer problema relacionado às suas correias dentadas banhadas em óleo.